Tradutor (incluindo Português)

18/05/2013

O que acontece quando você sai do Facebook?


O que acontece quando você sai do Facebook?


POR CAROLINA CUNHA 
Em São Paulo

Foi com um esfuziante “I’m back bitches!” que Davisson Alves cumprimentou seus amigos no Facebook. O paulista que ficou mais de quatro meses longe da rede social acabara de retornar.
- Me fale do rehab, pergunto a Davisson, num café da rua Augusta.
É noite de segunda-feira e ele parece relaxado. Durante toda a conversa não colocou o celular na mesa uma única vez.
- Tudo começou com a pergunta: o que você precisa para ser feliz?, responde, entre um gole e outro de água.
Aos 31 anos, a blusa xadrez, o tênis all star, a barba por fazer e os óculos de aros pretos dão um efeito hispter em sua aparência. Davisson é um profissional de comunicação digital, mas não pode se gabar das cifras que acompanham o setor. Ele trabalha numa ONG.
A dúvida metafísica [o que você precisa pra ser feliz?] que pipocou no seu Facebook era um convite para participar do projeto 100 Face, que buscava 100 voluntários para a experiência de 100 dias sem acesso à rede social. “Sem likes, sem shares, sem comentários, sem publicar fotos, sem enquetes, sem grupos, sem inbox pros amigos ou attend em festinhas. Ah, sem joguinhos, sem feed de sites, sem promos, sem concursos culturais. Totalmente 100FACE, você aguenta?”, dizia a mensagem para os voluntários.
Davisson tinha quase certeza que não. Toda vez que ligava o computador, no trabalho ou em casa, a primeira coisa que fazia era abrir o Facebook. Em segundos, ficava absorto pela vastidão da rede, clicando numa informação atrás da outra. Parabenizar o aniversário de amigo, compartilhar uma piada, curtir uma foto ou descobrir os segredos de seu alvo amoroso parecia mais importante do que qualquer outra coisa. Quando atualizava seu status, esperava com expectativa alguns comentários.
“Comecei a perceber que o uso da rede me deixava muito ansioso. Eu dava F5 o tempo todo. Era como se fosse uma droga. Em qualquer momento de ócio era para o Facebook que eu ia”.
Para Davisson, terminar o check-list de tarefas pessoais estava ficando impossível. A rede social alimentava o hábito da procrastinação, a mania de deixar tudo para depois. Ao final do dia, a sensação de nunca terminar nada o deixava frustrado. “Conclui que precisava aplicar este tempo de alguma outra forma na minha vida”.
Antes que o apocalipse chegasse, Davisson decidiu agir. O primeiro passo foi jogar na lixeira o aplicativo da rede social do celular 3G. Mark Zuckerberg, o mandachuva do Facebookestima que 23% do tempo dos usuários de smartphones são gastos na rede social. Para quem busca parar, o aplicativo sempre à palma da mão é semelhante ao fumante que tem como vizinho uma loja de conveniência 24 horas.
Países como China, Coreia do Sul e Taiwan já reconhecem o vício na internet e no Facebook como uma doença psicológica – de fato, nossa atenção coletiva desde 2000 já foi reduzida em 40%.
Mas agora Davisson tinha um motivo para sair do playground. E no dia 23 de setembro de 2012 avisou a todos que faria um facebookcídio temporário. Na verdade, tinha esperanças de nunca mais voltar.
100 Facebook

STATUS: OFFLINE

“O que vou fazer no computador sem acessar o Facebook?”.  No primeiro dia da experiência, Davisson sentiu uma sensação de perda. “A impressão é que você está procurando alguma coisa, mas você não sabe muito bem o que é”, lembra.
Ele procurou preencher o vazio fingindo a si mesmo que estava ocupado demais para navegar. Voltou a praticar antigos hobbies, como desenhar à mão, ver filmes, ler livros. Na mudança de hábito, o celular voltou a ser sua principal ferramenta de contato com o mundo exterior. No trabalho, a atenção melhorou, mas ele não se tornou exatamente um Gênio da Produtividade.
A vida social seguiu sem traumas. Apenas os amigos mais íntimos o convidavam para eventos e confraternizações. O que antes chegava no inbox do Face, agora vinha por e-mail. “Senti que apenas as pessoas mais próximas tiveram essa preocupação de me informar alguma coisa”, diz.
Alguns bate-papos ficaram até mais chatos e perigosos, com uma leve pitada de bullying. Em reuniões nos bares, era comum o assunto da mesa ser alguma polêmica ou o último meme que fez sucesso no Facebook. “Todo mundo me olhava com aquela cara meio de dó. ‘Ah… você não está no Face né?’ Eu me senti super excluído”.
Davisson até começou a dar conselhos sobre a rede. Certa vez, uma amiga desabafou com ele sobre a inveja que tinha das pessoas do Facebook. Todas pareciam muito felizes com seus casamentos e filhos perfeitos. O conselho de Davisson veio por experiência própria.
“Sabe quando você pensa assim: o que eu preciso fazer para ser igual a fulano? Eu já me fiz este questionamento. No Face, você vê pessoas indo nos melhores lugares, andando com as pessoas mais legais. Aí você pensa: gente, o quanto disso é real? Será que essa pessoa é tão autoconfiante assim? Será que ela é tão amável assim? Aí você reflete. Não. Ela é que nem eu e também tem seus dias bons e ruins”.
Ao final dos 100 dias, alguns participantes desistiram no meio do caminho, e a maioria voltou para o Facebook. Um usuário reclamou que o mais difícil foi passar a data de aniversário sem receber parabéns de alguns amigos.
No caso de Davisson, a volta pra o Facebook surgiu pela necessidade profissional. A decisão foi tomada depois de assistir a uma palestra sobre o mercado de trabalho criativo que indicava que a rede era o melhor local para contatos profissionais. Hoje ele acorda e acessa o Facebook uma única vez.

O CAMINHO DO MEIO

Sem a angústia de antes, Davisson consegue reavaliar sua relação com o Facebook. “Na realidade, eu acho que era uma forma de tentar me abstrair, como um divertimento, mas na realidade, só me causava ansiedade. Por mais que eu seguisse pessoas e marcas que eu achava interessantes, o que era postado ali era muito superficial”.
Para evitar a velha rotina, estabeleceu algumas regras, ou como ele diz, “fiz um acordo interno”. Não acessa a rede em feriados e finais de semana, exceto em alguma emergência. Durante a semana, limita seus acessos a uma vez por dia, seja no celular ou no computador. Se ele se preocupa em perder a piada do momento ou a notícia mais importante do dia? “Se for importante, ela vai se repetir na rede” ensina.
Agora que voltou, Davisson precisou se acostumar com as novidades. O maior susto foi quando viu a quantidade de publicidade exibida na timeline. “O Facebook virou um mercado, uma briga de venda de conteúdo”, analisa ele, que cita como incômodo o número de anúncios de aplicativos em sua timeline.
Apesar de tudo, ele passou a pensar melhor no que escrever na rede. “Foi bem produtivo este tempo fora. Sinto que consegui focar em coisas que queria. Hoje vejo que tem muita informação ali importante e que me interessa. Mas em contrapartida, a quantidade de informação irrelevante e sem sentido… Acho que é uma forma de prisão. É o estar por estar. É dar like por dar like. É o seguir por seguir”, diz ele, que menos ansioso, agora busca seguir o planejado: usar a rede de forma mais consciente.
E a tal felicidade? “Em vez de deixar a rede me dominar, eu que sou o usuário é quem tem que dizer o momento certo de usar, e não ao contrário. Não vou deixar você me dominar”.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...