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09/07/2013

Dependência química e acesso: qual o melhor foco de atenção pública?

Dependência química e acesso: qual o melhor foco de atenção pública? 

Renato O. Rossi

Encerrado neste dia 25, o ciclo de debates Um Novo Olhar Sobre o Dependente Químico, que aconteceu na Assembléia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) e trouxe uma proposta bastante polêmica. "Fomos muito cobrados de que o poder público não ajuda na reinserção de usuários de drogas", alega o presidente da Comissão de Enfrentamento ao Crack, o deputado estadual Vanderlei Miranda. Ainda não há resposta definitiva sobre o posicionamento de instâncias superiores estaduais frente a essa proposta, de reservar 10% das vagas de concursos públicos para dependentes químicos.

Até aí a ideia pode parecer bastante positiva e até vanguardista. Mas antes precisamos discutir certos aspectos no contexto da dependência química, como acesso, deficiência e políticas de saúde.

Primeiro acesso, sim. É compreensível que o dependente químico possa encontrar dificuldade em relação a assumir seus direitos enquanto cidadão. Em termos de trabalho, de busca de serviços de saúde, de políticas de ação social de que poderia ser beneficiado. Muitos dependentes, e talvez os que mais precisem de políticas públicas direcionadas, são aqueles que têm mais dificuldade para se ter acesso. Pessoas em situação de rua, em muitos dos casos em envolvimento com drogas de abuso, são as que mais precisariam desse direcionamento. Mas agora temos que pensar um ponto: o acesso a trabalho, por mais importante que seja, é de fato a maior prioridade para os que mais tem necessidade de atenção do Estado? E, para aqueles que não estão em situação de rua, quais suas principais necessidades?

E deficiência. Tradicional e logicamente, separação de vagas em concursos públicos e benefícios para empresas que têm este tipo de discriminação de vaga têm a ver com inserção. E quem precisa mais de inserção senão aqueles com alguma limitação do acesso ao emprego? Deficientes físicos, mentais, portadores de certas doenças que possam ser obstáculos para esse acesso são os principais beneficiados com essas políticas de separação de vagas. Mas onde neste ponto estariam os dependentes químicos? Onde estaria seu obstáculo objetivo?

E políticas de saúde. Ou falta delas. O foco da atenção governamental em relação às drogas tem sido muito voltado para a área de penalização e de segurança pública. O dependente é muitas vezes tratado como criminoso, não como alguém que necessita de uma intervenção de saúde. Podemos entender melhor isso vendo exemplos internacionais. A Holanda recentemente passou a cogitar o fechamento de alguns presídios por falta de presos para ocupar as vagas. Já os Estados Unidos possui a maior população carcerária do mundo, com a maioria estando presa devido ao envolvimento com drogas em algum nível. Historicamente, a Holanda foi um grande expoente das políticas de Redução de Danos, enquanto os EUA foram os pioneiros da "War on Drugs" (Guerra às Drogas). Coincidência? E quanto ao Brasil? Faça um exercício simples: pegue alguns jornais em qualquer dia e marque em quantas matérias é citado o tema das drogas. Feito isso, divida em quantas o foco era policiamento/segurança pública e em quantas o foco era saúde. Esse será o posicionamento do Brasil. Você vai se surpreender!

A possibilidade de aumentar o acesso dos dependentes químicos a direitos fundamentais é sempre positivo, mas precisamos pensar se o foco está bem direcionado. Dependência não é deficiência. Sob um olhar oliveinsteiniano da dependência, a droga não é em si o problema, mas sim a relação indivíduo-droga. Seus traços de personalidade e vulnerabilidades individuais aumentariam a chance do desenvolvimento dessa relação patológica com pessoas, comportamentos ou substâncias. E relações patológicas são melhor tratadas em contexto de saúde. E populações de dependentes químicos são melhor tratadas em contexto de políticas públicas de saúde. Há que se investir em uma rede ampla e articulada de saúde mental, que inclua o dependente e que dê espaço a ele. Consultórios de rua, CAPS-AD, um serviço de atenção básica que consiga recepcionar e intervir diretivamente com o dependente. Tantas coisas que se mostram como base para a reabilitação do indivíduo, para que este não se veja e que seja visto apenas como dependente, mas como pessoa. E que a deficiência do dependente, que só existe no olhar enviesado da sociedade, possa ser revertida.

Mais informações sobre este assunto, clique aqui.

*Renato Rossi:
Residente de Psiquiatria da UNIFESP
Colaborador do Causas Perdidas

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