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21/05/2013

A droga de cada um


A droga de cada um

Denis Russo Burgierman

Todo mundo tem a sua droga. A da minha mãe, por exemplo, é a endorfina, nome que é uma abreviação de “endo-morfina”, ou “morfina interior”. A endorfina é um opióide, ou seja, uma droga da mesma classe do ópio e da heroína. Os opióides agem como desentupidores nas sinapses do cérebro: eles abrem os caminhos pelos quais a dopamina flui. E a dopamina é a mãe de todas as recompensas: aquela sensação gostosa, aconchegante, de bem estar, que chamamos de prazer. É a dopamina que nos dá aquele gosto doce que acaba formando hábitos. É ela, também, que, quando algo sai do controle, causa a dependência.
Minha mãe busca a dopamina dela de maneira saudável, correndo pelas ruas e pelos parques de São Paulo, subindo em pódios com medalhas douradas no pescoço – exercício físico faz o corpo produzir endorfina. Há quem busque o prazer em outras coisas. Glutões produzem dopamina quando se empanturram. Yogues produzem quando respiram profundamente. Jogadores vão em busca dela na emoção das apostas do bingo ou do carteado. Futebol, chope, sexo, novela, dança, festa, trabalho, cinema – tudo aquilo que tem o potencial de dar prazer pode estimular a produção de dopamina. Inclusive drogas, como álcool, tabaco, nicotina, açúcar, maconha, cocaína, heroína.
Ontem participei da entrevista com o psiquiatra Ronaldo Laranjeira, no programa Roda Viva, da TV Cultura. Laranjeira é um médico-político, bem conectado com o poder, recebedor de farto financiamento público, com larga experiência em dependência, defensor radical da Guerra Contra as Drogas. Colegas de Laranjeira no mundo acadêmico já haviam me advertido que a droga dele é o poder. É a sensação de mandar nos outros aquilo que ativa seu sistema dopamínico.
A entrevista foi bem frustrante para mim. Laranjeira tomou a palavra e falou sem parar, sem dar atenção às perguntas que lhe faziam. Citou uma série de dados inventados, como a informação de que todos os países desenvolvidos estão abandonando as políticas de redução de danos – basicamente o contrário da realidade, já que há uma clara tendência no sentido contrário, até mesmo nos Estados Unidos.
Num dos intervalos do programa, uma das entrevistadoras, a especialista em segurança pública Ilona Szabo, deu uma bronca no entrevistado fora do ar, criticando a forma irresponsável como ele manipulava os dados. Laranjeira virou agressivamente sua cadeira para ela, aumentou o volume da voz, e brandiu o argumento da autoridade: “cresça e apareça, menina. Quem é você? Eu tenho 30 anos de experiência nisso”. Ilona respondeu tranquila: “eu trabalho com gente que tem o dobro de sua idade e que teve a humildade de mudar de ideia. Você pode mudar também.”
Aos 34 anos, Ilona é coordenadora do secretariado da Comissão Global de Políticas sobre Drogas, o órgão internacional cujo presidente é Fernando Henrique Cardoso (81 anos) e que tem entre seus membros gente como o ex-presidente do banco central americano Paul Volcker (85) e o ex-secretário de Estado dos EUA George Schultz (92), braços direito e esquerdo do ex-presidente Ronald Reagan, principal comandante da Guerra Contra as Drogas na década de 80. O objetivo da Comissão é acabar com a guerra e buscar soluções mais pacíficas e racionais para evitar que nosso apetite natural por dopamina nos destrua.
Nos anos 1980 e 90, FHC, Volcker, Schultz e Reagan eram generais da Guerra Contra as Drogas. Laranjeira, naquele tempo, era um soldado raso, talvez um jovem oficial dedicado a dar alguma sustentação científica para a ofensiva militar. Hoje os generais não apenas estão cansados de lutar mas pedem desculpas pelos erros do passado: eles reconhecem que a guerra foi um equívoco.
Mas o soldado Laranjeira quer continuar lutando. Afinal, ele não está preocupado em saber se a guerra dá certo ou não. O que ele quer é poder – e, consequentemente, dopamina. No fundo, ele sabe que a guerra é inútil, mas sabe também que, se ela acabar, ele perde poder. Ele é dependente de poder.
Denis Russo BurgiermanDenis Russo Burgierman
Diretor de redação da Superinteressante. Escreveu o livro O Fim da Guerra, sobre o futuro das políticas de drogas, participa da comunidade TED, dá aulas na Eise (Escola de Inovação em Serviços) e é membro da Rede Pense Livre – Por Uma Política de Drogas que Funcione. Pedala entre uma coisa e outra. 

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3 comentários:

  1. Fiz especialização em Dependência Química com dependentes, adultos, casal, adolescentes e seus familiares com atendimentos individuais e em grupo na Unifesp - Universidade Federal de São Paulo em outro departamento para tratamento de drogas, não do Dr. Laranjeira e frequento grupos de terapias comunitarias e o Naranon- Grupo de familiares e sou mãe de um dependente químico em recuperação, que iniciou o uso de drogas , solvente, maconha e cocaína, dos 14 aos 25 anos, ( e que em toda essa trajetória jurava de pé junto que "só "usava maconha, que ia parar quando tivesse vontade) que passou toda a sua adolescência em tratamentos com psicólogos, psiquiatras, passou por tratamentos ambulatoriais na Proad, Uniad e Uded todos da Unifesp e só teve um tratamento efetivo, quando em uma das últimas sessões de consulta psicologicas familiar eu percebi que estava psicótico e resolvemos (eu e o pai) fazer uma internação involuntária que depois de um mês se tornou voluntária, os tratamentos ambulatoriais no caso dele não surtiram efeito, pois em nenhum dos tratamentos ambulatoriais ele manteve a abstinência total da droga. Concordo em genero número e grau com as colocações do Dr. Laranjeira em relação as políticas públicas que ele esta pretendendo implementar.
    Quem convive no dia-a-dia, tanto com familiar como trabalhando com dependentes químicos e seus familiares, entende as colocações coerentes do Dr. Laranjeiras.
    Esse "papinho"de que o ser humano é livre para saber o que faz da sua vida, serve para quem não tem família, só se for, pois quando você tem um filho adolescente ou não, tudo o que o prejudica afeta a você familiar tanto quanto ou mais do que ele.
    Não sou ingênua em pensar que as drogas algum dia vão acabar, isso nunca irá acontecer.
    Mas o que esta sendo colocado em questão é a proteção do indivíduo e de sua familia.
    Mais uma vez coloco, só quem sente na "pele", ou seja tem um familiar dependente químico ou trabalha com seriedade e respeito com um dependente químico e seus familiares, sabe do que estou falando!

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  2. Ser ou ter um dependente químico em casa é uma situação muito difícil mas que pode ser revertida com apoio e ajuda médica adequada.
    http://reabilitacaodedrogas.com.br/

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  3. A dependência química é algo sério que precisa ser tratada com profissionais especializados.
    http://grupodereabilitacao.com.br

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